SUPERMAN DOS IRMÃOS FLEISCHER: UMA DAS ANIMAÇÕES MAIS IMPORTANTES DO PERSONAGEM

Diferente do que algum fã não muito inteirado da história do Homem de Aço pode pensar, não foi o ator Kirk Alyn, na cinessérie do “Superman”, lançada em 1948 e nem com o ator George Reeves na série de TV “The Adventure of Superman”, lançada em 195, na verdade, não foi nem um ator de verdade que encarnou o Super-Herói pela primeira vez, nos cinemas.

Para esclarecer essa questão, hoje trago para vocês algumas informações sobre a produção e lançamento dessa primeira série animada do Superman. A série contou com um total de 17 curtas, que ficaram conhecidos como “Os Desenhos Animados do Superman Fleischer”.

Primeiro logo do “Fleischer Studio’s”

Originalmente a série foi idealizada pela Fleischer Studios, que produzido cerca de nove episódios durante o ano de 1941, já no ano seguinte a Fleischer Studios foi dissolvida e reestruturada com o nome Famous Studios, que produziu os últimos oitos episódios. A cinessérie foi lançada em Technicolor pela Paramount Pictures.

Mais como a Fleischer Studios entrou na história das origens do Superman????

Bom tudo começou durante o ano de 1941, quando os irmãos judeus, de origem alemã, chamados Max, Joe e Dave Fleischer abriram seu estúdio de animação, localizado em Miami, Flórida, os mesmos já haviam terminado a produção do seu primeiro longa-metragem animado chamado “Gulliver’s Traves” e já estavam com a produção iniciada de seu próximo trabalho, o longa “Me. Bugs Goes to Town”.

As principais produções dos Fleischer Studio’s

Ao contrário dos estúdios Disney e Warner Brothers, cujas animações sempre tiveram foco total nos gêneros de Fantasia e Comédia, sempre envolvendo personagens antropomórficos, já os Fleischer focavam suas animações mais na ação e na ficção cientifica. Duas de suas animações envolviam mais famosas envolviam personagens humanos, eram o Popeye e a Betty Boop, com histórias recheadas de aventuras com muitas cenas de ação, perseguição e lutas.

Os irmãos Fleischer foram os criadores da técnica de animação chamada Rotoscopia, que se baseava em pessoas de verdade e que revolucionou o gênero de animação ao apresentar movimentos próximos da realidade.

Ao mesmo tempo a Paramount Pictures, juntamente com a National Comics Publications (antigo nome da editora DC) estavam bastante interessado em explorar financeiramente todo o sucesso que as HQs do Superman vinham fazendo desde 1938, para isso decidiram produzir uma série de curtas-metragens, para serem exibidas nas matinês nos cinemas, antes da exibição do filme principal.

Banner de apresentação da série

Para isso a Paramount entrou em contato com com o estúdio Fleischer para eles produzirem a cinessérie, porém com receio de ficarem sobrecarregados de produções eles decidiram não aceitar mais nenhum trabalho extra, já que além de produzir longas animados, o estúdio ainda era responsável pelas produções das cinessérie animadas do Popeye e da Betty Boop.

Com essa decisão tomada, quando foram abordados pela distribuidora e proprietária majoritária de seu estúdio desde maio de 1941, a Paramount Pictures, os Fleischers se opuseram fortemente, porém de forma silenciosa, à ideia de se comprometer com outro grande projeto.

Como forma de rejeitar esse novo trabalho, os Fleischers, sem parecer não cooperativos, começaram a procurar uma maneira de rejeitar o projeto, para isso eles disseram que fariam a cinessérie, porém cobrando um valor
intencionalmente inflado por cada episódio, tudo na esperança de que a Paramount se veria obrigado a rejeitá-los, no entanto ocorreu o inverso, o estúdio ofereceu a Paramount o valor de 100 mil dólares por cada episódio, em 2021 esse valor foi atualizado pela inflação americana para cerca de 1,43 milhão de dólares por cada episódio curta, em 1941 este era cerca de quatro vezes maior que o orçamento típico de um episódio de seis minutos dos populares desenhos animados da cinessérie “Popeye: The Sailor” naquele mesmo período.

Salvando a Lois

Para o espanto dos Fleischers, em vez de retirar seu pedido, a Paramount entrou em negociações com eles, e ofereceu uma contraproposta de 50 mil dólares por episódio, cerca de 717.394 mil dólares em 2021.

Agora, os Fleischers estavam comprometidos com um projeto que nunca quiseram fazer, porém com mais apoio financeiro e de marketing do que jamais haviam recebido para os projetos que haviam feito até aquele momento.

O trabalho dos Fleischer com a cinessérie foi tão brilhante que o primeiro episódio intitulado simplesmente de “Superman”, também conhecido como “Superman: The Mad Scientist”, lançado no dia 26 de setembro de 1941, foi indicado ao Oscar de Melhor Curta-Metragem: Desenhos Animados na premiação de 1942, ele perdeu para o desenho “Lend a Paw”, protagonizado pelo personagem Plutão da Walt Disney Productions e RKO Radio Pictures.

Os episódios, escritos pela dupla Izyy Sparber e Seymour Kneitel, tinham aquela velha formula básica que hoje soam como histórias ingênuas e sem aprofundamento, onde o Superman e a Lois se deparavam com alguma grande ameaça, como por exemplo cientistas loucos, espiões nazistas, monstros, ladrões de joias, na grande parte do tempo a Lois era capturada e colocada em perigo, fazendo com que o Clark tivesse que trocar de roupa e se tornar o Superman, terminando por salvar a Lois e derrota o inimigo, fim da história.

Mostrando sua invulnerabilidade

Porém embora a cinessérie tivesse essa fórmula repetitiva, e o desenho sendo obviamente um produto da época em que foi produzido, os Fleischer souberam capturar o tom fantástico, aventureiro e divertido das HQs do Superman que eram publicados na época.

Em relação a animação, tivemos algo verdadeiramente revolucionário, as cenas eram muito bem desenhadas, contendo excelentes cenas de ação, principalmente para a época em que foram produzidas, elas conseguiam retratar, com uma certa fidelidade a Nova York da época, que serviu de inspiração para a cidade de Metrópolis, e seus arranha-céus, onde a equipe de desenhistas apostavam em planos grandiosos, com multidões em cena.

Até uma preocupação com as personalidades dos personagens principais o estúdio teve, por exemplo a Lois era mostrada como uma repórter corajosa, e principalmente encrenqueira exatamente como era apresentada nas revistas, já o Superman era mostrado como um Super-Herói bondoso, altruísta e poderoso como sua versão quadrinistica.

Se preparando para a ação

Mesmo o foco sendo dado mais na ação e os personagens tendo um dialogo reduzido, era fácil identificar a personalidade deles através das frases, gestos, expressões e principalmente nas ações praticadas por eles, além de ter uma animação que mostrava que era um bom exemplo de história visual.

Para a dublagem da dupla principal, a equipe chamou os mesmos dubladores do programa de rádio “The Adventures of Superman”, o Bud Collyer fornecendo sua voz para o Clark Kent/Superman e a Joan Alexander emprestando sua voz para a intrépida repórter Lois Lane.

Bud Collyer dublando o Clark Kent/Superman e a Joan Alexander emprestando sua voz para a repórter Lois Lane

Já para a trilha sonora da série contrataram o compositor Sammy Timberg, que já vinha colaborando musicalmente com outras produções dos Fleischers.

Para o processo de animação utilizado era a rotoscopia, que traçava desenhos de animação a partir de imagens live-action, ele já havia sito utilizado em algumas cenas pela na produção de Branca de Neve e os Sete Anões, lançado em 1937 pela Walt Disney. Para a produção “Superman, os Fleischer usaram minimamente essa técnica, como forma de emprestar um certo grau de realismo aos movimentos corporais do personagem.

No entanto muitas das ações do Superman não poderiam ser feita com a rotoscopia, como por exemplo as cenas de voou, levantando objetos muito grandes e pesados, entre outras. Nesses casos específicos, os animadores principais dos Fleischers, muitos dos quais não possuíam treinamento em desenho de figuras, animavam de uma forma um pouco mais “grosseira”, para suprir essa dificuldade eles dependiam de seus assistentes, formado em grande parte por animadores inexperientes, porém que possuíam a capacidade de conseguir manter um modelo físico fixo para o Superman, principalmente em suas sequências de ação.

Outro detalhe que deve ser citado é que o fundo dos desenhos nunca estava parado, em todas as cenas, os personagens estão em constante movimento, assim como os objetos no ambiente ao seu redor. Podemos dar como exemplo, uma cena onde quando o Clark está conversando com a Lois, ambos estão se movimento pra um lado e pro outro, e diferente de outras animações da época, onde apenas os personagens principais seriam animados, aqui todos os elementos ao redor do Clark e da Lois, como por exemplo as sombras e o reflexos de luz mudando conforme os dois se movimentam, passando uma nítida sensação de que eles estão verdadeiramente vivos, assim como todo o ambiente ao redor deles.

Uma grande contribuição que a série dos irmãos Fleischer trouxeram para a mitologia do Superman, foi dá ao personagem um dos seus mais famosos superpoderes, a capacidade de voar

Quando o estúdio começou a trabalhar na série, nos quadrinhos o Superman não voava, quando o personagem foi criado, pela dupla Jerry Siegel e Joe Shuster, o personagem era apenas um homem com uma força física tremenda, uma pele invulnerável e capaz de pular grandes distâncias, algo como o que o Incrível Hulk faz na Marvel Comics, a editora concorrente da DC. É desse poder de pular de um lugar para um outro que surgiu a clássica frase:

“Capaz de saltar prédios altos em um único pulo”.

Inicialmente o estúdio fez a animação com o salto, porém a equipe considerou a sequência boba, eles não queriam fazer o Superman ficar pulando a cada momento de ação, para contornar essa situação, os Fleischer entraram em contato com a editora e pediram permissão para fazê-lo voar, a editora concordou e Superman recebeu formalmente o poder de voar, com o lançamento da cinessérie, os fãs amaram esse superpoder, fazendo com que a National Comics Publications passasse a usar essa nova habilidade nas HQs do personagem, marcando assim uma grande mudança no status quo do Homem de Aço.

A partir desse poder outros vieram, como a capacidade de atingir velocidades acima da Luz, de respirar e falar no espaço sideral e de mover planetas apenas com sua força, mudanças que, aos poucos o transformou quase em um deus.

Curiosidade: Antes de voar nos desenhos dos Fleischers, o Superman só foi mostrado em uma pose parecida com um voou na capa da “Triumph #772”, lançada em agosto de 1938 e na edição “Superman #10”, de Junho de 1941, mas aqui foi revelado que era um erro do desenhista e da equipe editorial.

Capas da “Triumph #772”, lançada em agosto de 1938 e da “Superman #10”, de Junho de 1941

A série teve seu término , como dissemos antes, com um total de dezessete episódios produzidos, a justificativa dado foi o alto custo de produção, além das restrições orçamentárias que foram impostas após a remoção dos Fleischers do estúdio. No total o custo dos episódios ficou em cerca de 530 mil dólares, equivalente a cerca de 6,73 milhões de dólares em 2021.

Fora esse alto valor, principalmente para a época, a Paramount divulgou que havia cancelado a série em decorrência de uma grande diminuição do interesse do público em relação aos desenhos do personagem, que eram exibidos nos cinemas.

Em relação aos direitos de todos os dezessete episódios eventualmente foram revertidos para a National Comics Publications, que licenciou os direitos de distribuição na TV para a Flamingo Films, a mesma que distribuía a série de TV Adventures of Superman, estrelada pelo ator George Reeves como Superman (logo falaremos sobre ela).

Algum tempo depois todos os episódios acabaram caindo em domínio público, e isso veio a acontecer devido à uma falha provocada pela editora National Comics Publications, que não renovou seus direitos autorais no período devido. Com isso eles puderam ser amplamente distribuídos em VHS, LaserDisc e DVD.  No entanto, atualmente a Warner Bros, via a DC Comics, conseguiu adquirir os elementos originais do filme para os desenhos animados.

No caso da DC/Warner, um dos maiores exemplos de criadores que foram inspirados pela animação dos Fleischer é o Bruce Timm, que se baseou no desenho para criar projetos como Batman série animada, Superman Série animada e Liga da Justiça sem limites, todos considerados marcos das animações da DC.

É verdade que Superman do Fleischer pode parecer datado e que existem muitas animações melhores atualmente como as séries animadas do Bruce Timm, Espetacular Homem Aranha e Vingadores Heróis mais poderosos da Terra. Porém nenhuma delas existiria se não fosse por esse desenho.

Poster do lançamento do DVD americano

Assim como aconteceu no lançamento de “Action Comics #01” em 1938, onde o Superman foi responsável por iniciar o gênero de Super-Heróis nos quadrinhos, seus curtas animados foi responsável por trazer esse gênero para as animações, tornando o desenho dos Fleischer uma das animações mais importantes e influentes da cultura Pop.

Mesmo tendo passado tantas décadas do lançamento dessa série, essa fase da mitologia do Superman ainda é lembrada e apreciada pelos fãs do Homem de Aço, tivemos longas animados e HQs, que apesar de não se passarem no mesmo Universo da série, bebeu muito de suas ambientação, podemos citar dois exemplos famosos, a HQ/longa animado “DC The New Frontier” e a HQ “DC Superman Smashes the Klan”.

DVD do lançamento do Superman dos Estúdios Fleischer no Brasil

Fora isso podemos afirmar que um dos maiores legados deixado pela série pelo Superman dos Fleischer foi ter servido como fonte de inspiração para criadores de muitas animações populares, como por exemplo a Hannah-Barbera, que nos trouxeram o excelente desenho “Johnny Quest”, que assim como “Superman” nos trazia roteiros sérios, profundos até.

Além deles posso citar aqui o produtor Genndy Tartakovsky criador dos excelentes “Dexter’s Laboratory”, “Samurai Jack”, “Star Wars: Clone Wars” e o mais recente “Primal”.

Até mesmo dentro da Warner/DC essa série influenciou um dos melhores produtor de séries animadas, nesse caso estou falando do Bruce Timm, que como todos sabem (pelo menos acho que sabem) se baseou nos curtas do Fleischer para criar todo o Universo que continha as séries “Batman: The Animated Series”, série animada, Superman: The Animated Series”, “Justice League” e “Justice League Unlimited”, todos considerados grandes marcos das animações da DC.

Até hoje essa série é vista como uma das mais importantes, com um grau de qualidade riquíssimo para os padrões da época. Para se ter uma ideia, em 1994 a série foi listada, no 33ª lugar em uma lista dos 50 maiores desenhos animados de todos os tempos, escolhido por membros do campo da animação.

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